Eng. Peter Alouche – Consultor e ex-metroviário
Não vou falar das extremas dificuldades que enfrentaram os
paulistanos e os pobres turistas da COPA, nestes cinco dias de greve do
Metrô, com o fechamento da maioria das estações, provocando o maior
congestionamento da história da Cidade deixando-a bloqueada. Não vou
citar a impossibilidade de muitos trabalhadores de chegarem a seu
trabalho, da velha senhora chegar à sua consulta médica, nem da mãe
desesperada levar seu filho ao pronto-socorro. Tudo isso é sabido e
infinitamente lamentável. Como são lastimáveis as consequências
negativas em termos econômicos para São Paulo e para o País. Também isso
é muito sabido. Também não vou entrar no mérito das razões da greve.
Isto é um assunto dos metroviários que ainda são funcionários da Empresa
e do Sindicato que deve saber o que faz.
Quero falar de um legado muito positivo que uma greve dessas, por mais desastrada que seja, pode deixar para nosso Metrô...
Quero falar de um legado muito positivo que uma greve dessas, por mais desastrada que seja, pode deixar para nosso Metrô...
Constatar, uma
vez a greve terminada, o sorriso do usuário entrando na estação aberta
como se fosse retornar à sua casa, onde por alguns dias ficou impedido
de penetrar...
Compartilhar da alegria do trabalhador que, mesmo levando
uma ou duas horas para chegar a seu trabalho, acha que está sendo
premiado por um transporte ideal...
Como é bom e reconfortante sentir o
amor que tem a população por seu Metrô !
Quero falar também de um legado mais político e técnico. Uma greve dessas acaba de vez com discussões de urbanistas, até famosos, que defendiam e ainda defendem a tese absurda de que Metrô é solução de transporte de país rico e que países “em desenvolvimento” teriam que se contentar com o transporte de superfície, porque ônibus seria a solução ideal e suficiente para o transporte de massa de grandes metrópoles como São Paulo e Rio de janeiro. Não esqueço dessa disputa iniciada na década de 80 por Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba e Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, que pregaram essas ideias em muitos foros nacionais (inclusive em São Paulo) e internacionais (inclusive UITP) prejudicando muito o financiamento de projetos metroferroviários porque contaminaram inclusive teses de bancos de desenvolvimento como o Banco Mundial.
Lembro, como se fosse hoje a declaração de Jaime Lerner: “há cidades que ficam esperando pelo metrô, como quem espera Godot. Nos anos 1970 cogitamos construir Metrô, mas os Metrôs são muito caros. A falta de recursos é a mãe da criatividade. Iniciamos a implantação dos corredores de ônibus. O transporte do futuro é de superfície...”. Ou então a afirmação taxativa de Enrique Peñalosa, no Congresso Internacional da UITP em Madrí: “Os ônibus permanecerão os únicos modos possíveis para se prover um transporte público para a maioria da população das cidades de países em desenvolvimento. Os metrôs têm custo muito alto. Nenhum metrô num país em desenvolvimento custou menos que US$ 100 milhões por quilômetro, um investimento duvidoso em cidades onde muitos não têm esgoto, escolas ou acesso a parques”.
Não resta dúvida que o sistema de ônibus é importante, para não dizer vital, para qualquer cidade, de grande ou médio porte. É o único transporte público que consegue chegar até o mais longínquo canto da cidade, servindo bairros pobres ou ricos, densos ou ermos, um verdadeiro transporte porta a porta. Os corredores de BRT também são muito importantes em grandes avenidas, para fazer fluir o transporte público por ônibus, com rapidez e qualidade. Mas daí a dizer que ônibus substitui metrô, é subestimar a inteligência de qualquer planejador de transporte. Ônibus é alimentador do Metrô.
A greve do Metrô de São Paulo mostrou definitivamente que o transporte de massa das grandes metrópoles é certamente o Metrô, custe ele o que custar, porque só ele consegue levar numa única faixa, um milhão de usuários por dia. Mas a greve teve outros legados positivos. Começou a reverter, pelo menos temporariamente, a atitude “negativista” que tinha a população em relação à superlotação do metrô e às “falhas operacionais” que tem apresentado nosso sistema, principalmente nas horas de pico.
Há também um recado particular, muito positivo, endereçado aos funcionários do nosso Metrô, principalmente aos que não viveram, como eu vivi, a implantação das primeiras linhas: A importância gigantesca de seu trabalho e a sua imensa responsabilidade face à população que eles servem.
Fico revoltado, às vezes, com alguns metroviários, inclusive
ex-colegas meus (Graças a Deus muito poucos), quando às vezes os
encontro por acaso e ao chamar-lhes a sua atenção sobre coisas no meu
ponto de vista erradas que percebo no sistema, na implantação ou no
planejamento das novas linhas.
Muitas vezes eles me respondem: “Isto não
é problema meu. Não é da minha responsabilidade”. É da sua
responsabilidade sim senhor.
Ser Metroviário, como eu concebo, não é uma
simples profissão.
É um sacerdócio, a serviço da população e da Cidade.
E quem não assim o vê, deveria ir procurar outro trabalho de menor
responsabilidade social.
Greve desastrada mas que nos deixa muito legado positivo....
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