Procurador da República em Presidente Prudente considera “gravíssimos” os fatos relatados pelo Sindicato dos Ferroviários no trecho que corta o Oeste Paulista
O Ministério Público Federal (MPF) vai instaurar um inquérito civil público para investigar a denúncia feita pelo Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias da Zona Sorocabana, que aponta o “abandono” do trecho ferroviário que corta a região de Presidente Prudente.
“Os fatos são gravíssimos. Vamos tomar as providências cabíveis, tanto judiciais quanto extrajudiciais”, afirmou o procurador da República Luís Roberto Gomes à reportagem do iFronteira, logo depois de receber a denúncia protocolada pelo sindicato, nesta quinta-feira (6). Ele adiantou que uma das medidas que poderão ser tomadas é, inclusive, a intervenção federal. O procurador deixou claro que pretende cobrar “providências enérgicas” para a reativação do transporte ferroviário na região de Presidente Prudente.
“O quadro geral aponta a falta de interesse da América Latina Logística [ALL] de prestar o serviço público de transporte ferroviário. O MPF vai tomar as medidas necessárias para coibir a conduta da concessionária. A ALL não é dona da malha ferroviária e, portanto, não pode fazer o que bem entende. Isso traz um grave prejuízo à economia regional e do Estado de São Paulo”, salientou Gomes. Ele também explicou que levará o caso ao conhecimento da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), órgão responsável pela fiscalização do transporte ferroviário.
“Temos a expectativa de a ALL rever a desativação de Presidente Prudente, cancelar a transferência de funcionários sediados em Presidente Prudente, investir na recuperação do trecho e recuperar a credibilidade perante as empresas que utilizam o transporte ferroviário”, disse o presidente do Sindicato dos Ferroviários, José Claudinei Messias.
“Nós precisamos de meios para desenvolver a região e um deles é a ferrovia”, afirmou o presidente da União das Entidades de Presidente Prudente (Uepp), Antônio Alberto Ribeiro Barbosa, que também esteve na sede da Procuradoria da República na cidade para aderir à denúncia feita pelo Sindicato dos Ferroviários. Ele disse que a Uepp apóia a denúncia porque "as inúmeras irregularidades apontadas na representação atentam diretamente contra o desenvolvimento regional, estadual e federal".
A denúncia
O Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias da Zona Sorocabana protocolou nesta quinta-feira (6), no Ministério Público Federal (MPF), em Presidente Prudente, uma denúncia contra a empresa América Latina Logística (ALL) em que aponta o “abandono” do trecho ferroviário que corta a região.
“Ao contrário da imagem de empresa que investe na ferrovia, a realidade é outra, pois a ALL continua insistindo em sucatear e desativar o trecho entre Presidente Prudente e Presidente Epitácio”, diz a denúncia, assinada pelo presidente da entidade, José Claudinei Messias.
O sindicato relata que, “além da clara intenção de desativar o trecho até Presidente Epitácio”, também a estação de Presidente Prudente e a base de atendimento a empresas distribuidoras de combustível e outros produtos “passam pelo mesmo processo de sucateamento e abandono”. Ainda conforme a denúncia, a ALL “não tem fornecido transporte regular, como sempre ocorreu desde a época estatal, desatendendo empresas, prejudicando-as”.
A denúncia ainda apresenta números que apontam a “drástica” redução da oferta de vagões em Presidente Prudente para o transporte ferroviário de combustível e cimento ao longo dos últimos 12 anos.
Conforme o relatório apresentado ao MPF, o transporte de cimento mobilizou 426 vagões em 2003, teve um ápice de 1.367 vagões em 2006 e fechou o ano de 2010 com apenas 121 vagões. Desde 2011, segundo o sindicato, não é feito o transporte de cimento por trilhos em Presidente Prudente.
Já o transporte de combustível alcançou o total de 3.418 vagões em 2003, chegou ao auge de 3.961 vagões em 2008 e terminou o ano de 2013 somente com 289 vagões. Neste ano de 2014, o transporte de combustível se limitou a dez vagões, até o momento, segundo o sindicato.
Ao analisar os dados, o sindicato conclui que a prática adotada pela empresa “vem totalmente contra o objetivo da concessão ferroviária, que seria de implementar e melhorar o transporte ferroviário e não ações como essa, que dilapidam o patrimônio público, desativam trechos antes produtivos, geram desemprego e perdas para os municípios envolvidos, além de grandes prejuízos às empresas outrora clientes e bem servidas pelo transporte ferroviário, o que não mais ocorre”.
Como reflexo, o sindicato avalia que isso onera o transporte, “aumentando o fluxo de caminhões nas rodovias e comprometendo a própria existência dessas empresas no município, o que pode afetar a economia regional e estadual, já que a ALL prioriza o atendimento às cidades do norte do Paraná, como Londrina e Maringá”.
No entendimento do sindicato, fica "clara a falta de empenho na prestação de serviço ferroviário confiável e de qualidade".
‘Desativação total’
No caso de Presidente Prudente, os funcionários sediados, como maquinistas e operadores de produção, já estão sendo transferidos para outras localidades, o que, na avaliação do sindicato, indica que “é clara e latente a intenção da desativação total desta importante sede ferroviária e fere o objeto da concessão, conforme já apontado anteriormente pela ANTT [Agência Nacional de Transporte Terrestres]”.
A denúncia apresentada ao MPF acusa a ALL de cometer três tipos de infrações: promover a desativação de trecho ferroviário integrante do Subsistema Ferroviário Federal, sem prévia e expressa autorização do poder concedente; abandonar o referido trecho, deixando de manter pessoal técnico e administrativo, próprio ou de terceiros, em número suficiente para prestação de serviço adequado; e falta de manutenção da via férrea, o que reduz a segurança dos serviços prestados, podendo ocasionar danos aos usuários, bem como à população que reside ou desloca-se próximo à faixa de domínio da ferrovia.
“As atitudes da empresa também podem ser verificadas com relação ao pátio de manobras, em estado de abandono, impedindo qualquer serviço seguro de manobras, e o próprio acesso aos desvios ferroviários é precário”, ressalta o sindicato.
Além disso, os dormentes estão, em sua maioria, podres e, portanto, inutilizados, e o mato tomou quase que totalmente o trecho, conforme o documento entregue à Procuradoria da República.
Circulação
Tais fatos, segundo o sindicato, “têm tornado praticamente impossível a circulação de trens no trecho”. Para se ter uma ideia, a entidade que representa os trabalhadores cita que, há cinco anos, a meta para o tempo de percurso de Ourinhos a Presidente Prudente era de 11 horas em média. No entanto, hoje esse tempo varia entre 20 a 24 horas, “o que causa prejuízos às empresas e descrédito na ALL”, conforme o sindicato.
“Além disso, a própria empresa emitiu Circular de Instruções Especiais no ano de 2012, editada pela Diretoria de Operações, restringindo as locomotivas que circulam pelo local, para as de menor capacidade de tração, ou seja, atualmente as locomotivas autorizadas a circular têm capacidade de 60% das locomotivas anteriormente autorizadas”, narra a denúncia protocolada no MPF.
O sindicato requereu à Procuradoria da República a instauração de um inquérito civil público para a apuração dos fatos e ainda que o assunto seja levado ao conhecimento do Ministério dos Transportes e da ANTT. O objetivo é fazer com que a empresa “reative e ofereça condições dignas de segurança à circulação de trens, disponibilização de vagões para transporte de combustível e suspenda a transferência dos funcionários”. A denúncia cogita ainda a possibilidade de solicitação de intervenção federal na ALL, conforme estipula o contrato de concessão vigente, “pois está promovendo a desativação de trecho ferroviário integrante do Subsistema Ferroviário Federal, sem prévia e expressa autorização do poder concedente, bem como abandonando o referido trecho, deixando de manter pessoal técnico e administrativo, próprio ou de terceiros, em número suficiente para prestação de serviço adequado, causando sérios prejuízos às empresas que contratam o transporte ferroviário, ao quadro funcional e prejuízos à economia regional e estadual, por ser um modal que deveria ser matriz no transporte de cargas”.
Histórico
Em maio de 2001, o sindicato foi autor da representação contra a empresa Ferroban – Ferrovias Bandeirantes S/A e a ALL, referente à retirada de trilhos TR-50, de excelente qualidade, e sua substituição por trilhos TR-37, de qualidade inferior e totalmente sucateados, o que ensejou a instauração de um inquérito civil público pelo Ministério Público Federal, em Presidente Prudente.
O Ministério dos Transportes, através da Secretaria dos Transportes Terrestres, determinou a imediata reposição dos trilhos em seu local de origem, bem como advertiu as empresas, para que tais fatos não mais ocorressem.
A ALL iniciou a reposição dos trilhos, efetivamente, a partir do dia 16 de julho de 2001, e o trecho voltou a sua situação anterior.
No entanto, segundo o Sindicato dos Ferroviários da Zona Sorocabana, mesmo após a recolocação dos trilhos, “a empresa continuou a sucatear o trecho e a situação de abandono foi novamente verificada em vários outros locais, a exemplo de Caiuá, onde havia mato, cercas de arame sobre os trilhos onde o gado pastava livremente e erosão impedindo a circulação de trens”.
Em agosto de 2002, houve nova denúncia por parte do sindicato. “Com a atuação decisiva desta Procuradoria da República, que esteve no local dos fatos em visita de inspeção, que culminou com o pedido de caducidade da concessão, teve como consequência imediata a empresa forçada a investir e reativar o trecho, a partir do final do mês de agosto de 2002, com o transporte de grãos da empresa Centro Sul de Presidente Epitácio”, explica o sindicato.
“Infelizmente, a reativação durou pouco tempo e no final do mês de outubro de 2002 o trecho foi novamente abandonado, fato esse verificado nos anos seguintes, com movimentos esporádicos sem qualquer caráter comercial e sim protelatório com a finalidade de tentar ‘mascarar’ a desativação do trecho, fato verificado até a presente data”, enfatiza a entidade que representa os trabalhadores.
Em decorrência das denúncias, segundo o sindicato, a ANTT aplicou uma multa de R$ 2.097.400,00 à concessionária ALL.
“A multa se justificou pelo descumprimento do disposto no Contrato de Concessão da Malha Sul e do Regulamento dos Transportes Ferroviários (RTF), no trecho Presidente Epitácio-Presidente Prudente. A ANTT, de acordo com o documento, considerou que a ALL cometeu as seguintes infrações: retirar trilhos do trecho Presidente Prudente-Álvares Machado e, posteriormente, promover recolocação de outros trilhos de qualidade inferior; não zelar pela integridade dos bens vinculados à concessão, neste caso o da via permanente do referido trecho; o serviço público de transporte ferroviário de cargas concedido encontrava-se fora de operação, ou seja, totalmente paralisado entre abril de 2000 e julho de 2002; promover a desativação de trecho ferroviário integrante do Subsistema Ferroviário Federal, sem prévia e expressa autorização do poder concedente; abandonar o referido trecho, deixando de manter pessoal técnico e administrativo, próprio ou de terceiros, em número suficiente para prestação de serviço adequado; falta de manutenção da via férrea, o que reduz a segurança dos serviços prestados, podendo ocasionar danos aos usuários, bem como à população que reside ou desloca-se próximo à faixa de domínio da ferrovia”, relata o sindicato.
Outro lado
Por meio de nota de sua Assessoria de Imprensa encaminhada ao iFronteira, a concessionária que administra a linha férrea informa que, caso seja notificada, irá analisar as questões expostas.
A concessionária informa, ainda, que executa intervenções na via permanente na região, quando necessário, no trecho entre os pátios de Presidente Epitácio e Presidente Prudente, com extensão aproximada de 104 km, atendendo todas as determinações técnicas da ANTT e “sempre garantindo condições de circulação em segurança”.
Além disso, a nota explica que, como procedimento de intervenção, a ALL está realizando, desde fevereiro, em Caiuá, a reestruturação da linha férrea que foi danificada pela chuva. No local, além do serviço de terraplanagem, estão sendo implantandas três galerias para o escoamento da água da chuva.
A concessionária informa também que se encontra periodicamente com empresas na região de Presidente Prudente, com o objetivo de esclarecer dúvidas sobre a prestação de serviços e o funcionamento da ferrovia, como peculiaridades do serviço ferroviário, dados técnicos, parâmetros operacionais e política de preços, entre outros pontos que possam viabilizar o transporte ferroviário na região.
Fonte: http://www.ifronteira.com/noticia-regiao-56093
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