Ramal da ferrovia Norte-Sul em Goiás; SP debate futuro do sistema ferroviário no Estado |
Na tarde de 24 de janeiro, São Paulo debaterá por quatro horas como serão os próximos 40 anos de um dos seus mais importantes bens, o sistema ferroviário.
Está em jogo a renovação ou não da concessão de 2.000 quilômetros do principal corredor ferroviário do Estado, que liga o porto de Santos ao Centro-Oeste. Antiga Ferroban, iniciada no século 19, agora chamada de Malha Paulista, as vias estão em poder da Rumo, do grupo Cosan (combustível e agrícola).
Para críticos, o governo federal dará mais 30 anos de concessão (a atual tem mais de anos) para a empresa que monopoliza a via para cargas de agricultura e que abandonou 832 quilômetros, deixando regiões sem atendimento.
A proposta da audiência pública é que, em troca da repactuação, a Rumo faça R$ 4,7 bilhões em investimentos, pague outro R$ 1,3 bilhão em outorgas e até R$ 2 bilhões em ressarcimento de dívidas.
A empresa diz que só a mudança de contrato poderá garantir obras que aumentam a capacidade atual em 150%, única maneira de poder operar mais cargas, trechos e compartilhar a via.
O governo defende que a renovação, analisada ao longo de quase dois anos, é a forma de mudar o contrato da privatização das vias, de 1998, na gestão de FHC, permitindo assim o uso por mais empresas e o fim de trechos abandonados.
Após a audiência pública, que deverá incorporar contribuições para melhorar a proposta de contrato, ainda haverá outras etapas até a renovação efetiva. A Folha apurou que ela só sairá com uma medida provisória aprovada e com a solução para todos os trechos da Rumo, que também controla vias que vão ao Sul.
DESENVOLVIMENTO
Ter malha densa é fator importante de desenvolvimento por reduzir custos de transporte. Com cerca de 5.000 quilômetros, o Estado tem extensão comparável à de países desenvolvidos, mas transporta pouco, mal e caro.
A velocidade do transporte é metade da média brasileira. Um de cada três clientes reclama do preço das ferrovias no Brasil.
No caso da Malha Paulista, ela poderia levar 75 milhões de toneladas/ano com as obras. Hoje, carrega 30 milhões e está no limite. Mas 93% do transportado são produtos agrícolas e combustíveis. Na prática, a ferrovia paulista serve mais a Mato Grosso, dizem os críticos.
Jean Pejo, secretário-geral da Associação Latino-Americana de Ferrovias, diz que só 6% das cargas produzidas em São Paulo usam trem. O restante, caminhão.
Isso ocorre por característica do contrato de privatização, que faz empresas privilegiarem trens grandes, para carga agrícola e mineral (chamadas "heavy haul"), em detrimento de trens menores, de cargas típicas industriais.
Por isso, trechos que não interessam ao "heavy haul" são abandonados, o que levou o Ministério Público Federal em São Paulo a propor ações contra a empresa por descumprimento das metas do contrato.
O temor dos críticos é que as regras propostas não garantam a volta imediata da operação e que, após a renovação do "filé", linhas menos rentáveis sejam abandonadas de vez.
Para Pejo, a chance de mudar essa realidade é com a repactuação dos contratos. Mas em novas bases, garantindo que empresas com expertise específica para cargas em trechos curtos ("short lines") possam transportar "o que hoje vai de caminhão".
MEDIDA
Estudo dos consultores do Senado Marcos Kleber Felix e João Trindade Filho diz que o marco legal de ferrovias é inibidor de investimentos, em razão da insegurança jurídica.
Renato Kloss, sócio de Infraestrutura do Escritório Siqueira Castro, lembra que o governo tenta mudar contratos das ferrovias desde 2011 sem sucesso e que o modelo proposto agora, baseado numa medida provisória em tramitação, é mais factível.
Na MP, o governo determinou que haverá compartilhamento da via, o que em tese poderia criar concorrência, reduzindo custos aos usuários. A crítica dos clientes é que não há regras claras sobre como trens de outras empresas usam a via, o que mantém a situação atual de monopólio.
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